Susan quer chocar você
Publicado em 25/04/2009 marleth@gazetadopovo.com.br
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Seria um conto de fadas se os contos de fadas não confinassem as mulheres feias nos papéis de bruxas. A escocesa Susan Boyle não é bonita e leva uma vida modesta. Corajosa, apresentou-se em um concurso de calouros transmitido pela tevê para todo o Reino Unido e impressionou o mundo com sua voz e afinação. Parece que todo mundo viu Susan no programa Britain’s Got Talent na tevê, nos jornais ou na internet. As pessoas ficam encantadas com a aparição da mulher de cabelo desgrenhado, que aparenta mais que seus 47 anos, diante de uma plateia e de um júri cruel, que riem dela. A câmera, maldosamente, põe em destaque algumas moças do auditório que não escondem o escárnio diante da figura tão atípica para aquele ambiente de superprodução. Susan canta I dreamed a dream, do musical Os Miseráveis, e seu talento faz os rostos da plateia e do júri assumirem expressões de espanto. Na primeira vez que se vê, é emocionante. Na segunda vez, percebe-se uma sombra cinzenta por trás da “revelação do ano”. Pelo menos eu percebi.
Susan é provocadora sem querer ser. Sua figura desajeitada e ingênua, propositalmente mantida assim pelos produtores do programa, reafirma que não só os bonitos, os “fashion”, os muito jovens têm talento. Na peneirada promovida pela indústria de entretenimento e pela mídia em geral, só sobram os que exibem imagem impecável. Ou alguém acredita que uma misteriosa combinação genética faz com que só meninas bonitas cantem bem? Tenho um palpite que, mesmo como figura exótica, Susan não teria chance em outros países. No reino de Elisabeth II há certa flexibilidade em relação à imagem corporal. Foi lá, afinal, que a linda princesa Diana foi substituída no coração do príncipe por uma madura e pouco vaidosa Camila Parker-Bowles. Preste atenção em filmes ingleses, irlandeses, escoceses e galeses: os atores são ótimos e, quase sempre, têm aparência comum ou são até bem feinhos. Definitivamente, a peneira que se usa por lá é outra.
ultima = 0;
Saiba mais
O gato e a pedra no lago
Grandes personagens que só nós conhecemos
A linha fina
Deixe-me ir, preciso andar
Diga-me o que faz no fim de semana...
Quem é essa tal Susan Boyle, que desrespeita uma por uma todas as regras do mundo das celebridades? Nasceu em uma cidadezinha escocesa, West Lothian. A mãe teve problemas no parto que comprometeram o desenvolvimento psicomotor de Susan e prejudicaram sua vida escolar. Ela passou a vida cuidando da mãe, que morreu, aos 91 anos, em 2007. Como não tem profissão, está desempregada e passa o tempo fazendo trabalho voluntário na igreja. Frase dela em entrevista ao canal ITV, que promove o programa de calouros: “Ria e o mundo rirá com você. Chore e você chorará sozinho. Eu não pretendo chorar sozinha para sempre”. Definitivamente, Susan não é original, mas ousa “sonhar um sonho”, como na música que interpretou. Parece que ousa até sonhar em encontrar um companheiro! Aqui no Brasil, onde os estereótipos que cercam a vida das mulheres são mais resistentes que a monarquia britânica, ririam dela ainda mais que aquela plateia sarcástica do Britain’s Got Talent.
A sombra cinza que vejo por trás da figura simpática de Susan é o uso descarado e impiedoso que os profissionais do show business vão fazer de sua imagem. Acho que não vão mudá-la tanto, pelo menos por enquanto, porque aí a brincadeira perderia a graça. Mas o produtor deve estar esfregando as mãozinhas de excitação, pensando em formas de lucrar em cima da pureza da escocesa. Além do mais, como uma pessoa que vivia confinada em casa, cuidando da mãe idosa, sobrevive à fama mundial? A julgar pelas entrevistas que tem dado, Susan está achando tudo divertido, especialmente o assédio das crianças nas ruas de sua cidade. Pode ser que seja um daqueles casos de 15 minutos de fama. Se for assim, melhor para ela. Lidar com este assédio por muito tempo deve ser enlouquecedor, assim como ver o interesse ir minguando aos poucos.
Consigo imaginar um final feliz para Susan: passado o interesse geral por ela, terá partes em musicais de tempos em tempos, fará sucesso nos cultos da igreja de West Lothian, de vez em quando será convidada para um programa de auditório. Será para sempre uma celebridade em sua cidade. Já está de bom tamanho. Mais que isso, é perigoso.
Marleth Silva é jornalista.
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Seria um conto de fadas se os contos de fadas não confinassem as mulheres feias nos papéis de bruxas. A escocesa Susan Boyle não é bonita e leva uma vida modesta. Corajosa, apresentou-se em um concurso de calouros transmitido pela tevê para todo o Reino Unido e impressionou o mundo com sua voz e afinação. Parece que todo mundo viu Susan no programa Britain’s Got Talent na tevê, nos jornais ou na internet. As pessoas ficam encantadas com a aparição da mulher de cabelo desgrenhado, que aparenta mais que seus 47 anos, diante de uma plateia e de um júri cruel, que riem dela. A câmera, maldosamente, põe em destaque algumas moças do auditório que não escondem o escárnio diante da figura tão atípica para aquele ambiente de superprodução. Susan canta I dreamed a dream, do musical Os Miseráveis, e seu talento faz os rostos da plateia e do júri assumirem expressões de espanto. Na primeira vez que se vê, é emocionante. Na segunda vez, percebe-se uma sombra cinzenta por trás da “revelação do ano”. Pelo menos eu percebi.
Susan é provocadora sem querer ser. Sua figura desajeitada e ingênua, propositalmente mantida assim pelos produtores do programa, reafirma que não só os bonitos, os “fashion”, os muito jovens têm talento. Na peneirada promovida pela indústria de entretenimento e pela mídia em geral, só sobram os que exibem imagem impecável. Ou alguém acredita que uma misteriosa combinação genética faz com que só meninas bonitas cantem bem? Tenho um palpite que, mesmo como figura exótica, Susan não teria chance em outros países. No reino de Elisabeth II há certa flexibilidade em relação à imagem corporal. Foi lá, afinal, que a linda princesa Diana foi substituída no coração do príncipe por uma madura e pouco vaidosa Camila Parker-Bowles. Preste atenção em filmes ingleses, irlandeses, escoceses e galeses: os atores são ótimos e, quase sempre, têm aparência comum ou são até bem feinhos. Definitivamente, a peneira que se usa por lá é outra.
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O gato e a pedra no lago
Grandes personagens que só nós conhecemos
A linha fina
Deixe-me ir, preciso andar
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Quem é essa tal Susan Boyle, que desrespeita uma por uma todas as regras do mundo das celebridades? Nasceu em uma cidadezinha escocesa, West Lothian. A mãe teve problemas no parto que comprometeram o desenvolvimento psicomotor de Susan e prejudicaram sua vida escolar. Ela passou a vida cuidando da mãe, que morreu, aos 91 anos, em 2007. Como não tem profissão, está desempregada e passa o tempo fazendo trabalho voluntário na igreja. Frase dela em entrevista ao canal ITV, que promove o programa de calouros: “Ria e o mundo rirá com você. Chore e você chorará sozinho. Eu não pretendo chorar sozinha para sempre”. Definitivamente, Susan não é original, mas ousa “sonhar um sonho”, como na música que interpretou. Parece que ousa até sonhar em encontrar um companheiro! Aqui no Brasil, onde os estereótipos que cercam a vida das mulheres são mais resistentes que a monarquia britânica, ririam dela ainda mais que aquela plateia sarcástica do Britain’s Got Talent.
A sombra cinza que vejo por trás da figura simpática de Susan é o uso descarado e impiedoso que os profissionais do show business vão fazer de sua imagem. Acho que não vão mudá-la tanto, pelo menos por enquanto, porque aí a brincadeira perderia a graça. Mas o produtor deve estar esfregando as mãozinhas de excitação, pensando em formas de lucrar em cima da pureza da escocesa. Além do mais, como uma pessoa que vivia confinada em casa, cuidando da mãe idosa, sobrevive à fama mundial? A julgar pelas entrevistas que tem dado, Susan está achando tudo divertido, especialmente o assédio das crianças nas ruas de sua cidade. Pode ser que seja um daqueles casos de 15 minutos de fama. Se for assim, melhor para ela. Lidar com este assédio por muito tempo deve ser enlouquecedor, assim como ver o interesse ir minguando aos poucos.
Consigo imaginar um final feliz para Susan: passado o interesse geral por ela, terá partes em musicais de tempos em tempos, fará sucesso nos cultos da igreja de West Lothian, de vez em quando será convidada para um programa de auditório. Será para sempre uma celebridade em sua cidade. Já está de bom tamanho. Mais que isso, é perigoso.
Marleth Silva é jornalista.